Publicado às 21h21min
*Texto escrito pelo economista Adam Patterson
A pandemia da Covid-19 está impactando diversos setores da economia. Não é diferente no segmento de fusões e aquisições (M&A).
Durante janeiro e fevereiro, os mercados pareceram resilientes às consequências do vírus. No Brasil, 2019 foi um ano recorde para as atividades de M&A e investimento em private equity, com mais de R$ 300 bilhões em negócios. Vários índices globais importantes atingiram recordes até o meio de fevereiro.
Em março tudo começou a mudar com a doença se espalhando pelo mundo e os “lockdowns” (cidades, estados e países interrompendo suas atividades) na Europa e nos Estados Unidos levando as pessoas ao trabalho em “home office” em massa.
As ações de muitas empresas de vários segmentos caíram com força. A incerteza é ruim para dealmaking (negócios). A pandemia trouxe um cenário desconhecido também para as fusões e aquisições.
A Bloomberg está relatando que a atividade de M&A caiu mais de 50% desde meados de março, em comparação com 2019.
No entanto, os deal makers estão sendo criativos. Gustavo Pies, diretor de fusões e aquisições do escritório de advocacia Marins Bertoldi, afirma: “no geral a dinâmica das operações continua praticamente a mesma, a maior dificuldade é não poder colocar todos na mesa ao mesmo tempo para dar maior agilidade na tomada de decisão, mas com o uso das ferramentas digitais isso pode ser superado”.
Os leilões estão acelerando caso as condições piorem. Os vendedores estão escolhendo termos a vista antecipadamente em relação a ofertas mais altas, e reuniões e negociações estão sendo realizadas por meio de bate-papo por vídeo, com todos os desafios tecnológicos associados. Esse é o momento das “deals digitais”.
As transações ainda estão sendo fechadas, apesar da turbulência do mercado, problemas de liquidez e estimativas difíceis de valuation (algumas realizadas no auge do mercado).
Mas algumas transações vêm sendo feitos desde bem antes da crise. Afinal, M&A é um jogo de longo prazo.
Com as visitas no local e outras diligências físicas atualmente fora de questão, a criação de novos negócios será mais difícil. Sem mencionar os desafios da integração por videoconferência. Algumas negociações atuais estarão em risco.
Algumas empresas podem adotar uma abordagem de “esperar para ver”, pois priorizam manter seus funcionários seguros e negócios à tona. Outras serão ousadas e aproveitarão oportunidades para inovar. Muitas decisões estratégicas precisarão ser tomadas pelos executivos: devem cancelar uma transação que está em estágio de preparação há muitos meses ou levá-la até a conclusão? A queda de mais de 30% nos mercados acionários criou oportunidades de compra?
Uma recessão global “carona” é muito provável este ano. Historicamente, a atividade de M&A se correlaciona fortemente com a evolução dos preços e do risco das ações, medida pela volatilidade implícita.
Os investidores estão avaliando o cenário, avaliando riscos e buscando valor e aproveitando oportunidades seletivas. A volatilidade interrompe a capacidade do consultor de avaliar se é um bom momento para comprar ou vender. Mas com o desafio, vem a oportunidade. Podemos observar uma mudança do “sellers market” vista ao longo dos últimos anos. A crise atual apresenta uma oportunidade para os compradores em dinheiro. Dinheiro é rei novamente. As casas de private equity estão sentadas em níveis recordes de “pó seco” (valores não alocados dos fundos de private equity) e geralmente fazem seus melhores investimentos em ciclos de queda.
Rafael Pilotto, da Concept Investimentos, afirma: “damos valor para o relacionamento de longo prazo. Acho que o momento exige cautela, mas não necessariamente renegociar termos ou se aproveitar das situações das empresas”.
Uma empresa pode tirar proveito do ambiente para executar sua agenda de aquisições estratégicas e posicionar o negócio para crescimento quando o mercado se recuperar. Esperam-se mais alienações dos ativos “non-core” também.
João Caetano, sócio-fundador da Redirection assessores de M&A conclui: “há um misto de receio e otimismo no ambiente de M&A, principalmente entre os Fundos de Private Equity. De imediato, várias transações serão canceladas ou suspensas até o cenário ficar mais previsível. Mas na sequência deveremos ter um ambiente mais favorável do que o anterior, onde havia uma abundância de capital disputando poucos negócios atrativos”.
*Adam Patterson é advisor na Redirection, companhia de M&A e Financial Advisory com sede em Curitiba.
Adam é economista britânico, tem pós-graduação em Economia pela Universidade de Londres, especialização em Investimentos pelo Instituto Real e MBA em Finanças pela Universidade Federal do Paraná.
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