A dívida pública federal, alimentada pelo desequilíbrio entre receitas e despesas do governo, pode ter efeito perverso sobre a população mais pobre e dependente das políticas públicas como saúde, educação e assistência social. O refinanciamento e a amortização da dívida repercutem de forma expressiva no orçamento público.
O relatório resumido da Execução Orçamentária do Governo Federal de dezembro de 2017 demonstra que no ano passado a quitação de parte da dívida vencida e o pagamento dos juros custaram ao país mais de R$ 462 bilhões. Entre as despesas liquidadas até dezembro passado, o gasto com a dívida só perdeu para a Previdência Social, que custou mais de R$ 655 bilhões.
Em 2017, foi gasto com a rolagem da dívida pública mais do que o dobro das despesas liquidadas com saúde e educação somadas (R$ 205 bilhões). Conforme o relatório, a dívida custou mais de cinco vezes os gastos com assistência social (Bolsa Família, assistência a crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência, por exemplo).
Amortização e refinanciamento da dívida remunera investidores que compraram títulos públicos. “O gasto é extremamente regressivo quanto à geração de renda. É um gasto que vai para os detentores de dívida pública”, aponta Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp. “Essa dívida que está aí não significou investimento”, critica Maria Luiza Fatorelli, professora associada da do programa de pós-graduação em artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e vinculada à campanha da Auditoria Cidadã da Dívida.
De acordo com o Tesouro Nacional, há quatro tipos de títulos na composição da dívida (atrelados ao câmbio, indexados pela inflação, prefixados ou com taxa flutuantes). Os “papéis” têm diferentes periodicidade de vencimento.
Oitenta e oito por cento dos detentores da dívida pública são investidores que atuam no Brasil que compram títulos por meio de bancos, corretoras, fundos de investimento e fundos de pensão. Apenas 12% são estrangeiros.
Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, do Senado Federal, explica que o endividamento público é uma das três formas clássicas de financiar o Estado, em todo o mundo. “A primeira modalidade é emitir moeda, que tem como custo a inflação. A segunda maneira é o aumento da a carga tributária, que os economistas chamam de peso morto: arrecada mas pode produzir desincentivo à atividade econômica. A terceira forma de financiar o Estado é a dívida. O governo emite títulos para o mercado, prometendo pagar em determinado prazo uma soma de juros”.
Para alguns economistas, a solução do alto endividamento público passa pela reforma da Previdência Social, despesa que mais pesa nas contas do governo. “Se não resolvermos isso, ou não quisermos aumentar impostos, daqui a 20 anos, 100% dos gastos públicos serão com a Previdência. O sistema previdenciário é insustentável do ponto de vista fiscal”, avalia José Márcio Camargo da PUC-RJ.
“Fica difícil mudar a situação fiscal sem mudar essa política. Além de tudo, há a possibilidade de os gastos previdenciários crescerem mais”, concorda Pedro Souza, pesquisador do Ipea.
O diretor-adjunto de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, Marco Cavalcanti, faz diagnóstico semelhante, e assinala as resistências na sociedade para efetuar a reforma. “A gente vai ter que chegar em um novo contrato social, a sociedade tem que se conscientizar que compromissos terão de ser feito no sentido de que algumas despesas com impacto social deverão ser reduzidas e talvez algumas receitas devam ser aumentadas também”, avalia.
“A costura política deveria ser um ajuste pegando primeiro os que estão mais em cima. Só que na hora, entram os fatores políticos e é quando se vê quais grupos têm mais força e os que têm menos força. Certamente isso (a mudança na Previdência) vai ficar distante do que é ideal”, prevê Pedro Souza.
Informações da Agência Brasil
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